Portugal e Espanha em seca

Portugal e Espanha são dos países mais afectados pela seca
A seca que está a assolar o continente europeu (e não só) deverá tornar-se a seca mais grave
dos últimos 500 anos. “Esta seca parece ser pior do que a de 2018, que era a pior desde o ano
1500”, diz o investigador Andrea Toreti, numa resposta dada por email ao PÚBLICO. “A seca
deste ano é mais intensa, persistente e afecta uma área muito maior” do que a de 2018,
explica o cientista do Centro de Investigação Comum (JRC, na sigla em inglês) da União
Europeia.
O cenário não é favorável e não se espera que a seca fique por aqui: “Em algumas zonas da
Península Ibérica, esperam-se condições mais secas do que o normal para os próximos três
meses.” Ainda assim, o investigador da Comissão Europeia acautela que a comparação deste
ano ainda está em curso e que serão recolhidos mais dados.
Os cientistas europeus alertam que “a seca actual parece ser mais grave do que a de 2018 e,
logo, a mais grave dos últimos 500 anos”. O ano de 1500 foi o ponto de partida de um estudo
em que foi feita a reconstituição do paleoclima – o clima predominante de uma determinada
altura do passado geológico, calculado através de modelos climáticos e registos naturais, como
os anéis das árvores ou sedimentos em lagos – pelo Centro de Investigação Comum da União
Europeia.
Essa análise foi feita para a seca de 2018, que foi “a pior até 2022”, refere Andrea Toreti. Nesta
análise, os cientistas descobriram também que a seca do ano de 1540 foi quase tão “severa”
como a de 2018 – além disso, as secas desta magnitude poderão tornar-se um “acontecimento
comum” já a partir do ano de 2043.
A seca na Europa é um dos temas debatidos numa conferência da Semana Mundial da Água
(World Water Week 2022), que começou na passada terça-feira e dura até 1 de Setembro.
“Esta é certamente uma das piores secas e ainda não chegou ao fim”, resume ao PÚBLICO o
cientista climático Valentin Aich, um dos oradores desta conferência.
A conferência hídrica será também híbrida: metade decorrerá em formato digital e outra
metade de forma presencial, em Estocolmo, na Suécia. O programa junta cientistas,
investigadores e decisores políticos para falar sobre a água e sobre os desafios em torno dela,
como a seca e outras facetas das alterações climáticas. “Vamos falar sobre a situação actual e
sobre como a podemos melhorar”, sintetiza Valentin Aich, do Global Water Partnership (GWP).
“Temos de mudar a forma como a nossa energia é produzida, temos de mudar a forma como
as nossas economias funcionam, a forma como entendemos os transportes, como produzimos
a nossa comida, como passamos as férias”, alerta. “As pessoas não estão a usar água como
deveriam estar a usá-la, estão a sobreexplorar os recursos”, diz por videochamada Valentin
Aich, que é também investigador no Instituto de Investigação sobre o Impacto Climático de
Potsdam, na Alemanha. “Há muitas mudanças necessárias.”
Uma Europa mais seca
As secas são uma das consequências mais fatais das alterações climáticas. Um relatório das
Nações Unidas publicado em Maio mostra que as secas causaram cerca de 650 mil mortes de
1970 a 2019; a maior parte destas mortes aconteceu em países em vias de desenvolvimento e
África é o continente onde mais se sofre com a seca. Por ano, a seca afecta mais de 55 milhões
de pessoas (incluindo a agricultura e a produção de gado). O mesmo relatório indica que a
frequência e duração da seca aumentaram em 29% nos últimos 20 anos. Até 2050, mais de seis
mil milhões de pessoas poderão sofrer com a escassez de água.
A chuva dos últimos dias em algumas zonas da Europa ajudou a aliviar a situação, que em
alguns casos serviu para “estabilizar e até reverter a tendência de agravamento de Agosto”, diz
Andrea Toreti. Até Novembro deste ano, “é provável que haja condições mais quentes e mais
secas do que o normal na região ocidental euro-mediterrânica”, afirma. Valentin Aich
concorda: “É uma situação excepcional. A chuva que vamos tendo alivia, mas não é suficiente.”
Portugal está na lista dos países europeus mais afectados. “Na União Europeia, tem sido
observado um claro défice de precipitação nos últimos três meses, sobretudo em Portugal,
Espanha, Sul de França, Alemanha central e de Leste, Itália central, Leste da Hungria e na parte
ocidental da Roménia”, escreve Andrea Toreti numa resposta por email.
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