Entre a vida e a morte
Se há famílias que têm dificuldade em suportar as despesas fúnebres dos seus entes queridos, há outras que optam por não ter filhos, concorrendo para o envelhecimento da população. Se por um lado há quem se endivide para pagar um funeral, há outros que não alargam as suas famílias para evitar custos com a educação dos filhos. São dois reversos dum cenário preocupante, fruto da conjuntura, e que acentua a tónica do estado do Estado Social. Vejamos.
O fenómeno do envelhecimento é uma realidade insofismável dos tempos modernos, em todos os países desenvolvidos, entre os quais se inclui Portugal. Porém, o nosso país está a envelhecer num ritmo bastante acelerado e preocupante. Em trinta anos, a percentagem de portugueses com mais de 65 anos passou de 11 por cento para 17,5 por cento. Se não houver uma inversão na tendência, e de acordo com uma estimativa do Instituto Nacional de Estatística, em 2050, cerca de 80 por cento da população portuguesa apresentar-se-á envelhecida e dependente, ficaremos com um país de velhos, sem jovens e sem substituição das gerações. Há uma explicação. O decréscimo contínuo da taxa de natalidade, a redução da taxa de mortalidade e o aumento da esperança média de vida explicam o país que se está a construir do ponto de vista demográfico.
Este contexto do decréscimo da natalidade é preocupante. A descida da natalidade registada em junho significa uma redução 19 por cento de bebés face ao mesmo mês de 2011. A manter-se esta tendência, 2012 terá menos 15 800 nascimentos do que 2011. A redução do número de nascimentos é uma tendência que se verifica nos últimos 30 anos, ainda que com algumas exceções. Esta contabilidade é feita através do Programa Nacional de Diagnóstico Precoce.
Este saldo negativo põe em causa a sustentabilidade da Segurança Social. Por um lado o aumento do número de pensionistas e o crescimento das despesas com prestações sociais e, por outro, a redução do número de jovens que acedem ao mercado de trabalho acentuam um cenário preocupante para os próximos anos.
A inexistência de políticas de apoio à maternidade, as reduções no abono de família, as despesas inerentes ao processo de educação dos filhos, bem como todos os aumentos que se perdem no argumentário da austeridade, são fatores que contribuem para um duplo atrofio. O atrofio da sustentabilidade da Segurança Social e, simultaneamente, um atrofiamento demográfico.
É preciso centrar o foco em políticas sociais de apoio à família. A tendência inverte-se, tal como já fazem alguns municípios, criando medidas de estímulo à natalidade, benefícios na água e em taxas municipais para as famílias com mais filhos. É excessivamente evidente a pouca atenção que em Portugal se presta às políticas sociais direcionadas para a família, havendo necessidade de mais do que duplicar o orçamento dedicado ao apoio às famílias com filhos.
Nascer em Portugal não pode ser uma penalização para as famílias. Ter filhos não pode ser visto como um luxo ou encargo. Morrer em Portugal também não pode ser mais um fator de envidamento para as famílias. Nascer e morrer num país que relega para segundo plano as políticas sociais de apoio à família é no mínimo um infortúnio! São a face paradigmática da vida e da morte num Estado que se diz Social.
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