Atravessamos o deserto ou ficamos a meio?

Por em 23 de Março de 2012

Apesar de algumas vozes incomodadas, por sinal as do costume, que nos bombardeiam semanalmente com pseudo-dramas irrelevantes, penso sinceramente que a maioria do País compreende o processo de transformação e sacrifício por que estamos a passar.

As sondagens valem o que valem, mas os números surgidos no último fim-de-semana são elucidativos: os partidos que suportam este governo, PSD e CDS-PP, continuam a garantir quase 50% dos votos e, portanto, a margem que garante a actual maioria absoluta. Isto, passados cerca de 9 meses de austeridade e medidas dificílimas, como não se via em Portugal há décadas.

Caso raro no contexto da cada vez mais complicada política europeia. Vejo esta realidade, acima de tudo, como prova de maturidade democrática da população portuguesa, que consegue ver a essência das coisas e compreender o que é essencial.

Uma prova importante, talvez a mais emblemática, desta maturidade, foi o acordo de concertação social celebrado há umas semanas. Foi uma prova de maturidade de vários agentes políticos e sociais, que tiveram a flexibilidade de sair das suas trincheiras para se encontrarem num ponto de acordo, que poupará o país a uma agitação social como a que temos visto noutras paragens.

Trouxe notícias incómodas, é certo. Mas traz também o potencial de quebrar alguns dos bloqueios da sociedade portuguesa. É mais fácil despedir, é verdade, seja por extinção do posto de trabalho ou por inadaptação.

É mais barato despedir, é também verdade – as empresas vão pagar menos pelos despedimentos. Teremos menores subsídios de desemprego. Termos menos férias e feriados – quatro menos, mais concretamente. Outros factores como a mobilidade geográfica, a flexibilidade funcional, o tempo de trabalho e retribuição passam a ser reguladas ao nível da empresa.

Ao contrário do que alguns apregoam, isto não é uma conspiração de patrões e governo para castigar os trabalhadores indefesos – como se esta linguagem ainda se adaptasse às relações laborais do século XXI. O que foi feito foi trazer alguma racionalidade e equidade num mercado de trabalho disfuncional, onde centenas de milhares não conseguem entrar, onde outros estão imóveis e onde as empresas, especialmente as PME’s têm, objectivamente, medo de contratar.

Naturalmente, isto não será a panaceia de todos os males e muito ainda há a fazer. Para a produtividade, importa também agir sobre as qualificações e competências de empresários e gestores, de modo a tornar as empresas mais eficazes – e aqui reside uma das grandes lacunas da economia portuguesa.

Estamos num processo de transformação que demorará tempo. Passar de um modelo de economia estatizante, dependente do Estado e dos investimentos em infra-estruturas para uma economia orientada para bens transaccionáveis, para a inovação e para as exportações.

Temos, felizmente, indicadores positivos que nos podem animar este trajecto: as exportações portuguesas cresceram 10,9 por cento e as importações caíram 7 por cento, numa análise trimestral datada de Janeiro. Este caminho, feito de mudança, será como atravessar um deserto…por muito que demore, há que chegar a um destino, nunca ficar a meio!

 

Sobre Carlos Sezões

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